Como aprender a aprender: técnica de meta-aprendizado FOAR

    Você sabe o que é meta-aprendizado? Aprender é uma necessidade constante, apesar de tudo poucas pessoas tiram um tempo para pensar quais práticas podem otimizar o processo de aprendizado. Talvez pelo costume de deixar toda essa responsabilidade aos professores, mas a internet modificou totalmente a relação que temos com a informação e hoje todos têm condição de aprender de tudo por conta própria. Aprender no menor tempo possível é um desejo antigo, quando eu era mais novo sempre vi anúncios sobre cursos de aprendizado relâmpago. Mas eu nunca imaginei que um dia eu iria compilar diversos estudos e técnicas no meu próprio método. Essa publicação é praticamente o resumo da minha quarentena de Covid-19.

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Tempo médio de leitura: 5 minutos

Oque é meta-aprendizado

    O meta-aprendizado é um ramo da metacognição relacionado ao aprendizado sobre os próprios processos de aprendizado, ou seja, meta-aprendizagem é a conscientização e compreensão do fenômeno do próprio aprendizado. Donald B. Maudsley descreveu meta-aprendizado pela primeira vez em 1979 como o processo pelo qual os alunos se tornam conscientes e cada vez mais controlam os hábitos de percepção, investigação, aprendizado e crescimento que eles internalizaram.

Oque é FOAR

    FOAR é uma técnica que desenvolvi para iniciar qualquer aprendizado desde o zero absoluto, baseada em diversas experiências pessoais e estudo científicos além de inspirada por alguns outros métodos. Apesar de compilar diversas técnicas a abordagem original é na estrutura da rotina para a otimização do hábito usando conceitos de cronobiologia e agregando estímulos multisensoriais para fortalecer a criação das memórias. É um ótimo método para manter uma rotina de estudos autodidatas ou mesmo servir de base para EAD — educação a distância. Essa é a síntese resumida em 4 passos: Focar, Observar, Absorver e Revisar.

  1. Focar: Defina exatamente o que você quer aprender

        Seja sensato quanto a duração em relação ao nível que quer chegar, essa etapa é para formar uma base sólida. Sugiro que cada pequeno passo para o objetivo do aprendizado caiba em uma sessão ou aula, sendo assim o aprendizado básico de qualquer assunto seguindo esse modelo será dividido em 6 sessões. Se for usar um curso já estruturado você pode pular essa etapa. Caso esteja partindo do zero busque boas fontes para guiar seu aprendizado, realmente se exponha a uma avalanche de informações. Esse é o primeiro contato com o conteúdo, mesmo se estiver seguindo um curso já estruturado dê uma panorâmica geral em cada etapa. Então foque pelo menos em 6 técnicas principais para poder chegar a seu objetivo com o mínimo de esforço e modularize as aulas em pequenos passos em um roteiro de aprendizado, do mais simples ao mais difícil. Como você gostaria que fosse apresentado ao assunto? Elabore um texto explicando cada etapa para alguém totalmente inapto. Não se preocupe se não estiver confiante a respeito, você irá revisar e melhorar esse texto ao longo do aprendizado.

  2. Observar: Organize o material

        Essa é a parte teórica do aprendizado, aprenda o suficiente para começar a prática de imediato e se auto-corrigir. A duração mínima de 3 dias pode ser otimizada dividindo em 2 sessões de 3 horas por dia com leves atividades físicas antes de cada, com um intervalo de no mínimo 6 horas entre elas. Os horários sugeridos são: das 9 horas da manhã ao meio dia e das 18 horas às 21 horas da noite. No início de cada sessão faça uma rápida revisão do aprendizado da sessão imediatamente anterior relendo suas anotações, foque em palavras-chaves que desencadeiam as lembranças principais do assunto. E na última sessão do dia faça a leitura prévia do material de amanhã.
        Memórias são formadas de maneira multissensorial: escolha uma boa trilha sonora, alguém para se inspirar, um sabor de bala, um filme ou série e sempre que puder varie o ambiente mas evite distrações. Comece seus estudos com alguma leitura, depois busque exemplos audiovisuais. Se possível converse e discuta para sanar possíveis dúvidas, revise suas anotações e parta para as primeiras tentativas.

  3. Absorver: Pratique calibrando sua atenção

        O aprendizado só começa a contar com o início da prática. Nessa etapa você inicia oscilando entre Observar e Absorver. Use fones de ouvido, tenha pelo menos 20 minutos seguidos de prática, planeje bem suas pausas e calibre sua atenção com 2 minutos de meditação antes de voltar. Teste formas diferentes de fazer a mesma tarefa com pelo menos 2 repetições de cada e analise aleatoriedades que surgiram durante o aprendizado, elas podem contribuir até mesmo para criar seu próprio estilo. Responda questionários e faça anotações escrevendo à mão (podem ser até desenhos ou piadas do assunto), realmente espalhe post its pelo ambiente para se lembrar ao longo do dia. Depois de dominar um pouco, tente ajudar alguém na mesma etapa de aprendizado. Caso esteja se preparando para uma prova ou evento, treine e faça as simulações no mesmo horário do evento pelo menos nos 3 dias anteriores.
        Esse é um exercício para fazer toda noite antes de dormir. Enquanto adormece imagine sua rotina de amanhã como uma história:

    1. Revise mentalmente cada etapa ou movimento do aprendizado, anuncie-os em voz alta se puder, simulando uma execução perfeita amanhã
    2. Pense em como agir em diversas situações hipotéticas, como prever e evitar certos riscos nas atividades que está envolvido simulando conversas com alguém durante o café da manhã

  4. Revisar: Simplifique suas anotações, ensine alguém e planeje as revisões

        Lembre-se da dificuldade que teve durante seu aprendizado, essa é a oportunidade para atualizar a ordem de cada etapa de modo detalhado para que a próxima pessoa que for consultá-las não tenha as mesmas dificuldades. O objetivo é simplificar para facilitar a própria revisão mas também deixar um legado de conhecimentos para alguém. Faça uma síntese de conceitos e um passo a passo igual um tutorial além de tópicos básicos como vocabulários específicos e atalhos. Faça mapas mentais como fluxogramas, infográficos ou até vídeos curtos explicando cada etapa que podem ser consultados individualmente, e que combinados (até em uma playlist) explicam um contexto maior. O último passo é ensinar. Orientar finaliza seu processo de aprendizado e te torna a fonte do início do aprendizado de alguém.
        Depois de uma semana faça uma revisão completa, agende uma nova revisão para um mês e outra daqui a 3 meses. Caso queira melhorar seu nível de proficiência: Continue a praticar procurando fontes alternativas para consolidar o melhor método, mantenha suas anotações atualizadas e adicione novas etapas além das 6 básicas do aprendizado inicial.

    Para mais detalhes e esclarecer qualquer dúvida ou curiosidade sobre essa organização recomendo a leitura completa a seguir:

Tempo médio de leitura: 60 minutos

Porque aprender a aprender

Um dos maiores desafios atuais é reestruturar a forma de aprendizado. Ninguém ainda tem um método pedagógico definitivo bem elaborado para as novas tendências e necessidades da sociedade moderna. Com pouca ênfase nas novas tecnologias, nossa metodologia ainda é a mesma de 300 anos atrás
Karen Cator, 2016 — educadora americana
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    Antigamente a maior parte da informação era contida em livros. Nem todos tinham acesso e a melhor maneira de instruir parte da população era reuni-los em uma biblioteca e ministrar aulas na academia. As disciplinas também demoravam mais para serem atualizadas, dando uma sensação de definitividade. Ensinar virou sinônimo de separar alguns anos de vida do indivíduo para instruí-lo o máximo possível, muitas vezes decorando o conteúdo, pois pode ser que a localização onde ele iria atuar não existiriam tais livros ou qualquer comunicação para consultas. Toda essa dificuldade geográfica já era um grande motivo para que habilidades hoje básicas como leitura e escrita fossem restritas. Por consequência houve a elitização do conhecimento como ferramenta de controle.

    A democratização da informação está descentralizando a maneira tradicional de como víamos não só a educação, mas também o jornalismo e a política. A facilidade de acessar e produzir informação com a internet e smartphones gerou não só uma crise na autoridade mas também na confiança. Hoje as pessoas participam não só na divulgação de conteúdo, mas também criação e tem espaço para contesta-lo de uma forma jamais vista. Com mais dificuldade de validar sua autoridade, metodologias centralizadas perdem espaço para organizações horizontais descentralizadas. Ironicamente aos moldes da própria arquitetura física planejada para a internet.

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    Essa nova forma de tratar a informação modificou completamente a relação que temos com ela, hoje não apenas consumimos como também a produzimos e co-produzimos, é a era dos prosumers — produtor + consumidor — evidenciando a importância que a comunidade anônima tem no legado de conhecimentos da humanidade. Porém o ensino ainda insiste no antigo método e é tratado como um sistema instrucional com via de mão única. Com muita ênfase na memorização nossos testes e provas ainda buscam comprovar uma necessidade de séculos atrás. Livros e jornais impressos não conseguem acompanhar a volatilidade da informação na era moderna. O antigo significado de ensino parece defasado com a velocidade e o acesso as informações, aprender e ensinar hoje é um movimento de atualização contínuo como uma via de mão dupla. Essa horizontalização e co-participação no fluxo da informação, com cada vez mais oportunidades para contestar e reformular o conteúdo, passa a sensação de que o ensino tradicional é uma forma de autoritarismo.

    Hoje porém com o crescente choque de conteúdo — termo cunhado por Mark Schaefer — existe mais informação a disposição de qualquer pessoa do que ela pode consumir (Businesses Grow, 2014). O Youtube por exemplo recebe 300 horas de vídeo por minuto. Com esse excesso de informação a metodologia de ensino deve se moldar a necessidade de busca e pesquisa, organizando o conteúdo com a demanda volátil do momento.

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Gráfico ilustrando o choque de conteúdo, hoje é muito comum existirem "celebridades desconhecidas" por exemplo

    Devido a essa enorme quantidade de informações devemos nos atentar a um erro de raciocínio indutivo que constantemente nos assola, o viés de confirmação: tendência natural de lembrar, interpretar ou pesquisar por informações de maneira a confirmar as crenças ou hipóteses que já temos. Restringindo nossos horizontes de busca e criando os perigosos efeitos bolha, onde quanto mais fundamentamos nossas hipóteses com conteúdos relacionados, mais emocionalmente nos apegamos e as consolidamos como verdades absolutas. Isso gera uma perda contínua de neuroplasticidade — capacidade do cérebro se transformar criando novos neurônios e novas conexões — sendo um dos principais fatores que dificultam o aprendizado ao longo do tempo. Aliado a isso ainda existem os algoritmos que sugerem conteúdos que mais agradam a cada público, e podem sutilmente se tornar uma nova autoridade nessa era sem nem ao menos nos darmos conta. A única solução é ficar atento ao próprio comportamento e as diversas perspectivas, respeitando o ponto de vista alheio.

    O sistema de recompensas emocionais do cérebro está ligado com as coisas que cada pessoa busca ao seu tempo, sejam criança ou adultos. Porém classificamos crianças com déficit de atenção e ministramos drogas poderosas para atender ao comportamento que desejamos, quando na verdade insistimos em um método de educação já antiquado a realidade das informações. A doutrinação de massas sempre foi uma necessidade dos sistemas de governo para passar seus valores e demonstrar sua autoridade. Alternativas polêmicas para a educação começam a ganhar força, como a desescolarização ou homeschoolingensino domiciliar no Brasil — e as Escolas Democráticas — como: Summer Hill na Inglaterra, Escola da Ponte em Portugal e o Projeto Âncora no Brasil. Que ensinam em um ritmo personalizado somando valores emocionais cientificamente comprovados no processo de aprendizado, além de exercerem a autonomia e o senso crítico fazendo as crianças participarem diretamente da gestão escolar.

    A almejada perfeição é um reflexo dinâmico e constante da evolução dos próprios conceitos para análise comparativa, sendo logo inalcançável. É mais prudente buscar uma forma de educação maleável o suficiente, podendo ser revista e modernizada a qualquer momento. Onde tanto o instrutor quanto o aluno aprendam e se atualizem juntos pois o legado de conhecimentos sempre acumula a cada geração, mesmo que progressivamente cada geração se esqueça parcialmente de algumas experiências que edificaram certos conceitos. Nosso método tradicional também erra ao supervalorizar a teoria em detrimento da prática. Não precisamos mais focar tanto na memorização do conteúdo, temos acesso constante à informação. Hoje podemos filtrar e adaptar a instrução que precisamos de acordo com as necessidades imediatas.

    Foque mais em projetos funcionais do que em cursos. O problema dos cursos é supervalorizar a autoridade do diploma e a dificuldade do aprendizado para se vender como uma necessidade. Não importa seu diploma ou quanto tempo você passa aprendendo se a estrutura do ensino não está otimizada para resolver os problemas atuais. E se o ensino não é crítico ele só forma mão-de-obra para atender a necessidades momentâneas da sociedade sem as bases necessárias para se atualizar.

    O maior impedimento para aprender qualquer nova habilidade não é intelectual é emocional. O sentimento de incompetência por estar começando e a frustração inicial. Não existe diferença fisiológica entre estar nervoso ou excitado, a única diferença é a nossa interpretação consciente a respeito. Pense em todas as coisas que você gostaria de aprender, procrastinou e se sabotou a vida inteira por achar muito complexo, demorado, desgastante ou trabalhoso. A graça da ciência não está em acumular conhecimento de forma categórica, a graça é a exploração do desconhecido e o desafio de tentar entender. Nossa única originalidade é a forma como montamos esse imenso quebra-cabeças, somos retalhos de influências e pensamentos coletivos mas ainda podemos dar nosso pequeno toque pessoal.

    Eu nunca tive muita certeza quanto aos rumos da vida. Sempre gostei de experimentar de tudo, e nunca me apeguei a nada talvez por medo de dedicar uma vida a algo que fosse me decepcionar depois. FOAR é um princípio para otimizar o processo de aprendizado baseado nas minhas próprias experiências e em vários outros métodos e estudos científicos, cada qual com seus devidos créditos ao longo da leitura a seguir.

Temos que aprender a aprender no menor tempo possível nessa era dinâmica em que vivemos, em meio a esse dilúvio de informações

Atila Iamarino, TEDx 2017

Como aprender usando a técnica FOAR

    Com o passar do tempo e o acúmulo de informações, a cada novo conhecimento o cérebro tem um enorme repertório para comparação e análise. Aprendemos novas coisas integrando-as a nossa rede de conhecimentos, isso é um produto da nossa neurologia e gera o efeito de gostar mais do que soa familiar. As áreas do cérebro ativadas ao ouvir música são projetadas para procurar padrões e familiaridade, logo ajudam a decidir quais estímulos prestar atenção e quais ignorar. Porém para se interessar por algo é preciso ter alguma novidade além de evocar esse sentimento de familiaridade, fazendo paralelos com as idéias e conceitos que você já tem. Como uma reciclagem. É o mesmo princípio que gera os efeitos bolhas, gostos musicais são um dos maiores exemplos do funcionamento do viés de confirmação.

reciclagem
Efeito bolha é similar a um argumento circular, se não há fluxo de novidades para o sistema ele não evolui. O acúmulo de complexidade na biologia aparentemente vai contra a lei de entropia, mas acrescenta nova informação e energia aos sistemas isolados
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Esse rápido infográfico é para ilustrar dois extensos trabalhos acadêmicos: a taxonomia de Bloom que classifica o nível de domínio do aprendizado e a pirâmide de Willian Glasser que analisa as diferentes formas de aprender concluindo que quanto mais participativo melhor

    John Hattie em seus livros Aprendizagem Visível de 2008 e Aprendizagem Visível para Professores de 2017, analisou milhares de estudos que envolveram milhões de estudantes em todo mundo ao longo de mais de 20 anos. Os programas mais bem-sucedidos foram: os de aceleração (quando alunos são colocados em turmas mais avançadas), ensino recíproco (quando alunos são orientados a ensinar fazendo o papel de professores), autoverbalização, autoquestionamento, autoavaliação, ou seja notas auto atribuídas e expectativa do aluno (agrega valores de familiaridade além de edificar melhor as bases para progredir para o próximo passo) e ensino por resolução de problemas. Outro modelo usado para entender os níveis de aprendizado e integrá-los aos objetivos de aprendizagem é o modelo SOLO (estrutura dos resultados de aprendizagem observados) desenvolvido por Biggs e Collis em 1982. Os primeiros dois níveis abordam a aprendizagem da superficial, e os dois últimos são sobre o processamento mais aprofundado e analítico. Juntas, a compreensão superficial e profunda, desenvolvem a compreensão conceitual:

  1. Uni estrutural: uma ideia
  2. Multi estrutural: muitas ideias
  3. Relacional: associar ideias
  4. Abstrato estendido: ampliar ideias

Focar

    Como já mencionei, os cursos hoje atendem muito mais a um interesse comercial do que de fato têm uma preocupação pedagógica em desenvolver o aprendizado da melhor forma possível. E muitas vezes nós mesmos nos preocupamos mais com os gastos ou com algum retorno financeiro. Existem dois tipos de relações sociais: as profissionais e as emocionais. Muitas vezes elas não se complementam e em questão de auxílio no processo de aprendizado, a emocional tem o maior peso. Porém é mais difícil iniciar um projeto por conta própria do que pagar um curso, pois a realidade do prejuízo na falta de dedicação é mais evidente. Podemos até achar fácil dizer qual nível gostaríamos de alcançar, mas por conta própria é difícil identificar o percurso, a duração, e buscar por fontes. E essa é a única facilidade que os cursos te vendem. Em técnicas de manipulação semântica, apresentar o lado positivo antes do negativo ajuda na aceitação da tese. E pode-se estender esse príncípio a todos os aspectos da vida, mantenha sempre essa visualização de contraste. Então, pensar na conquista do objetivo primeiro antes de ver os desafios e obstáculos irá te dar um estímulo maior.

    Com o avançar da ciência e tecnologia novas ferramentas possibilitam pessoas menos capacitadas alcançarem níveis que antes apenas pessoas mais habilidosas conseguiam. Quais novas ferramentas e técnicas podem simplificar essa atividade? Se mantenha atualizado quanto a novas tecnologias e ferramentas no meio digital, não é necessário desenvolver uma habilidade complexa para executar atividades que antes precisavam de mais dedicação.

Duração

    Por conta própria já havia notado que o aprendizado flui melhor pouco depois de um árduo começo e gradativamente aparenta se tornar menos produtivo, pois cada nova informação acrescenta perceptivelmente menos novidade, parecido com a sensação do tempo ir passando mais rápido ao longo da vida — Explicado pela Lei de Weber. Depois de certo tempo, evoluir se torna um processo de descobrir os pequenos erros durante a execução e de forma crítica melhorar a performance pouco a pouco.

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Essa é a curva de aprendizado, uma representação do nível médio cognitivo para aprender uma nova habilidade ou usar uma nova ferramenta. Foi descrita pela primeira vez por Hermann Ebbinghaus em 1885

    Essa é sem dúvidas a maior inspiração que tive para compilar e reestruturar parte do que acumulei em relação ao processo de aprendizado: Josh Kaufman é especialista em ensinar novas habilidades em diversas áreas. Em sua palestra sobre seu novo livro "The First 20 hours: Mastering the Toughest part of Learning Anything", ele enfatiza o erro na interpretação popular do aprendizado de algo novo durar 10 mil horas. Essas 10 mil horas são para alguém se profissionalizar e se tornar um expert na sua área. A pesquisa que deu origem a essas famosas 10 mil horas foi baseada nos estudos de K. Anders Ercisson, um professor universitário da Flórida que focou sua pesquisa nos melhores músicos, jogadores de xadrez e atletas de sua época (Taylor and Francis Online, 1998). Quando você quer aprender a tocar violão, geralmente não tem a pretensão de alcançar o nível dos maiores músicos do mundo não é mesmo? Simplesmente quer dominar a habilidade e tocar alguma melodia já conhecida. Todos nós já tivemos a experiência de aprender algo completamente novo e não precisar dessas 10 mil horas. E esse foi o foco de Josh com a proposta de aprender qualquer coisa em 20 horas. Incentivado pelo nascimento de sua filha ele pesquisou o tempo mínimo necessário para alguém inapto aprender qualquer nova habilidade com um bom nível de proficiência.

    É mais fácil desenvolver novos hábitos do que corrigir maus hábitos. Imagina saber os horários que você tem mais disposição, os horários que o cérebro se encontra no pico de suas atividades e com facilidade desenvolver hábitos saudáveis de maneira mais eficiente. Compilei outros estudos sobre como criar novos hábitos usando conceitos de cronobiologia nessa publicação, e combinado com a teoria das 20 horas de Kaufman determinei a duração mínima para um bom aprendizado: 3 dias, é o tempo para o cérebro consolidar novas rotinas de maneira saudável. Esse período também se mostra como um dos melhores para perceber a própria evolução no processo de aprendizado. De acordo com a curva de posição serial na psicologia, temos a tendência de lembrar melhor da primeira e da última coisa de algum acontecimento e como temos certas rotinas semanais fixas, aos fins de semana é uma ótima oportunidade para usar esse método. Mantenha foco e dedicação durante esses 3 dias — anote, crie vídeos ou áudios para consultar depois, quanto mais informação melhor. O importante é ter material para reforçar seu aprendizado e perceber a própria evolução. Logo, para preparar o organismo para sua melhor performance para alguma grande prova ou evento usando conceitos de cronobiologia, treine e faça as simulações no mesmo horário do evento pelo menos nos 3 dias anteriores.

    Força de vontade e dedicação são um recurso finito. Analise seus pontos fortes e pontos fracos. Seja sincero sobre sua própria personalidade, seu nível de procrastinação e especialmente o quanto você se anima e logo abandona um projeto. Isso acontece com a maioria das pessoas, teorizar demais um objetivo sem iniciar a prática alimenta as emoções só na idealização dos resultados, e o contraste com a realidade aos poucos desmotiva. O ideal é alimentar o sistema de recompensas do cérebro de acordo com o desenvolvimento do projeto, estruturando o aprendizado em pequenas etapas e curtir cada conquista. Devido a crescente quantidade de informações na era digital, a capacidade de manter atenção também diminuiu consideravelmente. Em uma sociedade de mercado com o marketing tão agressivo, para manter a concentração o subconsciente gasta muita energia filtrando quais informações deve ignorar e muitas vezes falha com tantas distrações, e isso influencia muito o nosso comportamento em diversas áreas. Se antes 3 ou 4 horas eram bons intervalos para conseguir manter o foco, atualmente a maioria das pessoas ficam exaustas com apenas 2 horas, as vezes até menos. Por isso hoje é importante intercalar atividades diferentes com mais frequência. Segundo o documentário "Take your Pills" no Netflix, cerca de 25% dos estudantes nos EUA mantém o uso regular de nootrópicos, substâncias para melhora cognitiva. Os mesmos medicamentos utilizados para tratar déficit de atenção em crianças. A ritalina e similares simplemente fazem o cérebro focar nos resultados ao invés do custo durante a execução das tarefas, configurando o mindset para que a atividade seja mais prazerosa (brown.edu, 2023). Porém o açafrão tem praticamente os mesmos benefícios da ritalina (Journal of Child and Adolescent Psychopharmacology, 2019)

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Morpheus oferecendo a Neo uma escolha no filme Matrix de 1999

Calibrando o cérebro

    Foco é essencial no processo de consolidação de memórias de longo prazo. Se você tiver problemas pessoais, tentar resolvê-los antes ajuda a melhorar sua atenção. Você precisa se livrar ao máximo da preocupação e da ansiedade para liberar a parte do cérebro que trabalha em segundo plano.

Allan Snyder, através de estimulação magnética transcraniana “desliga partes do cérebro” para aumentar a capacidade dos indivíduos em algumas habilidades. Ajuda a calibrar a atenção parecido com o estado de transe na hipnose, diminuindo interação entre autoconsciência, planejamento e execução de tarefas. Ao executar atividades físicas por exemplo, os movimentos são processados no córtex motor e pensar demais para executá-los gera sinapses em áreas ligadas ao planejamento no córtex pré frontal. Uma atividade cerebral em regiões erradas pode prejudicar a outra.

Science Direct, 2012

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Alan Snyder com seu experimento que parece saído de ficção científica

    O cérebro funciona com míseros 20 watts de potência, pouco mais forte que a lâmpada de uma geladeira. A natureza preza por eficiência energética, executar múltiplas tarefas e querer ter o mesmo desempenho de alguém dedicado é apostar em um milagre. Imagine que o cérebro é uma associação de lâmpadas, e que cada neurônio pisque e consuma uma certa energia. Mesmo não sabendo exatamente como as partes do cérebro e os neurônios se conectam, com uma energia tão limitada fica óbvio que para melhorar o desempenho de cada região "desligar lâmpadas desnecessárias" é uma boa solução. Procrastinação, preguiça e a falta de energia estão relacionados com a nossa insistência de querer ser multitarefas, seja para resolver todos os problemas de última hora ou fazer o mínimo necessário, de qualquer jeito... poupando energia. Então atenção a energia do seu cérebro também e não só a bateria do seu celular, preze por eficiência de maneira consciente.

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    A dificuldade de aprendizado a distância é pelo costume de que em vídeos gravados o ritmo ser mais assertivo devido a edição, logo as video aulas ao vivo parecem mais lentas. Cortar celular fora do horário e ser mais rígido estipulando pausas melhora a produtividade. Existe uma técnica milenar que ajuda a calibrar a atenção, nessa outra publicação compilei mais alguns estudos para uma técnica de 2 minutos de meditação. Muitas evidências sugerem que a atenção plena — Mindfulness em inglês — pode nos ajudar a estar mais presente na vida, em vez de tropeçarmos cegamente perdendo momentos importantes com nossa mania de querer ser multi-tarefas. Dedique atenção ao momento presente, foque nas coisas que pode agir de imediato. O tempo só avança e seu passado não muda, ele é oque você fez hoje, por isso importe-se mais com o presente. É uma atitude pequena mas ao se tornar um hábito ajuda a manter a neuroplasticidade.

Ciclos e Etapas

    Gostamos do sentimento de liberdade, é bom não sofrer a pressão nem por responsabilidades. Porém trabalhamos tanto em manter diversas oportunidades abertas que muitas vezes nossa energia e empenho são drenados do foco principal. Dan Ariely mostra em seu livro "Previsivelmente Irracional" que trabalhos acadêmicos com datas rígidas para serem entregues têm melhores resultados do que trabalhos sem datas específicas. E muito antes de Dan Ariely fazer suas pesquisas sobre a produtividade de trabalhos acadêmicos, Sun Tzu já brincava com vidas e chegou ao mesmo conceito em "A arte da Guerra" no capítulo 7: "Ponha os soldados em uma situação sem alternativas se não o confronto e eles irão lutar com todo o empenho por suas vidas".

Sun-Tzu
Escrito na vertical e em tiras de bambu pelo General Sun Tzu em 500 AC, são 13 capítulos com as lendárias estratégias de guerra

    Porém respeite os momentos de exaustão e não se esforce muito, pois também não haverá boa produtividade. Não se animar com as atividades pode ser um sinal de que a metodologia que você está usando não é boa o suficiente para despertar o interesse do cérebro, ligando o aprendizado as emoções necessárias para formar boas memórias ou não compreendeu bem algum conceito para prosseguir para o próximo passo. Saiba identificar oque é um real desgaste de procrastinação e distração. Aquela quebra na atividade para dar uma rápida olhadinha no celular desorienta completamente suas sinapses, essa ansiedade diminui sua concentração e produtividade. Neurônios de movimento visual são os principais responsáveis por distrações (Neuron, 2023)

    Organize bem suas pausas, elas são extremamentes importantes no processo de aprendizado. Spacing Effect é um fenômeno no qual a aprendizagem é melhor quando o estudo é espaçado ao longo do tempo ao invés de estudar a mesma quantidade de uma vez só. Todo mundo pode aprender as mesmas coisas, mas cada um tem seu próprio tempo. Na psicologia, a adaptação hedônica é a tendência de regressar rapidamente a um nível relativamente estável de felicidade e motivação apesar da ocorrência de importantes acontecimentos positivos ou negativos. Ter pausas até mesmo em atividades prazerosas evita a adaptação hedônica, e torna o retorno a elas mais prazeroso do que mantê-la de forma contínua. Ernest Hemingway, escritor russo, já usava desse princípo quando inventou a técnica de "interrupção útil" para vencer a procrastinação e manter produtivamente a criatividade em suas obras. Posteriormente o efeito Hemingway foi descrito e o conceito ampliado por Oyama Yoshinori da Universidade de Chiba no Japão (American Psychological Association, 2017). Se por um lado pequenas pausas úteis durante atividades prazerozas estimulam a criatividade e estendem o bem-estar, resolver problemas que te incomodam o quanto antes e de uma vez é melhor do que estender essa atividade desgastante fragmentando-a demais. Inicialmente use a técnica Pomodoro como uma orientação básica: adaptando as atividades em ciclos de 20 minutos com descansos de 8 minutos mais 2 minutos com a técnica de meditação para calibrar o cérebro para o próximo ciclo de atividades de 20 minutos.

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Técnica Pomodoro é um método de gerenciamento de tempo desenvolvido por Francesco Cirillo no final dos anos 1980

    Com períodos curtos é mais difícil procrastinar, ciclos e repetições nos dão segurança. Cada etapa do processo de aprendizado precisa ser curta e objetiva, como nas metodologias ágeis no desenvolvimento de software: entregar produtos funcionais ao longo da produção traz o cliente (aqui aluno) para mais perto do desenvolvimento do produto (aqui do aprendizado), fazendo parte e co-criando diminui-se a necessidade de marketing (avaliações e provas clássicas), pois o feedback ao longo da criação entregou o produto ou serviço de acordo com esperado. Entregar constantemente algo produtivo além de orientar corretamente o sistema de recompensas no cérebro melhora o valor percebido em relação a própria evolução. Para facilitar estipule seus projetos de acordo com ciclos naturais. Use dias para se orientar nos períodos de dia e noite, semanas com as fases da lua e estações do ano para se aproveitar das sensações da época, quanto mais estímulos sensoriais melhor as lembranças.

Observar

    Nenhuma criação da humanidade se compara ao valor das diferentes formas de comunicação que a nossa espécie desenvolveu. Com apenas 24 letras em nosso alfabeto conseguimos expressar uma imensa quantidade de idéias, é impressionante como a maior parte do fluxo dos nossos pensamentos mais complexos derive de uma base de combinações tão pequena. Seja a oral ou escrita, rompemos a forma natural de como os indivíduos e a biologia acumulam e transmitem informação. Temos a capacidade de passar para a próxima geração um legado maior de instruções do que a anterior encontrou. Esse é o poder do aprendizado coletivo. A linguística é uma extensão relatada do universo que podemos aprender além das informações captadas por nossos próprios sentidos. Pegando linhas de raciocínios de outros indivíduos, damos continuidade nesta jornada coletiva de conhecimentos. Observar a experiência dos outros, ter alguem como inspiração pode acelerar demais o processo de aprendizado. O peso da linguística na interpretação é tanto que dependendo do idioma que somos alfabetizados cada um tem diferentes fluxos de pensamentos. Mais ligada a estruturas científicas, a linguística hoje toma para si parte da responsabilidade de definir as interpretações da realidade, renegando a filosofia quase que exclusivamente ao campo artístico. Ludwing Wittgenstein em seu livro "Tractatus Logico-Philosophicus" quase chega a uma conclusão como "A filosofia está morta", ironicamente contrapondo Nietzsche.

Fontes

    Existe uma supervalorização em relação a originalidade, a vontade de ser apreciado e uma preocupação com os direitos autorais. Desenvolver algo 100% autoral as vezes é um desgaste desnecessário. Saiba usar as contribuições alheias com os devidos créditos, não fique cego pelo ego ou é no reconhecimento que você irá depositar toda a expectativa da recompensa emocional do cérebro. Às vezes uma pequena contribuição em um conjunto de grandes obras tem um valor inestimável. Se interesse pelo ponto de vista alheio, não se prenda só a própria perspectiva. Estar preso em um argumento circular e nem ao menos perceber é a pior coisa no aprendizado. Conecte-se. Entender o ponto de vista alheio dá oportunidades de fazer paralelos enriquecendo o aprendizado mantendo uma perspectiva ampla. Criatividade não é a profundidade de conhecimentos que você tem em determinada área é a adaptação prática do conhecimento em outros setores, é a diversão da inteligência.

Ao treinar sozinhos muitas vezes podemos estar edificando nossos próprios erros

Vesemir durante o treinamento da Ciri em "The Withcer 3: Wild Hunt"

    Quando não temos conhecimento algum, qualquer ponto de partida é válido. Geralmente damos mais valor às conquistas fruto do nosso próprio esforço, porém é mais fácil chegar a níveis de prática e conhecimentos já adquiridos por alguém do que ir aprendendo sozinho por tentativa e erro. Logo, se quiser uma rápida evolução, se inspire em alguém. Procure bons exemplos para seu aprendizado, a internet é o maior legado de conhecimentos da humanidade. A história passou por diversos momentos de exploração, é irônico que mesmo com tanta informação aparentamos estar tão perdidos e nos encontremos novamente em uma situação de exploração mas de um recurso tão abundante e de fácil acesso. Até o momento em que estruturarmos as informações de um novo modo, a mineração de informações será essencial na atualização do processo de aprendizado. A nova mina de ouro é a mineração de idéias e a criatividade de combina-las atualizando-as. Pode ser desgastante a busca por boas fontes, mas essa é uma etapa essencial que define a qualidade, a duração e a velocidade do aprendizado. Dedique-se. Uma das principais partes do processo de aprendizado está em observar. Gostamos de ser espectadores, filmes e séries ajudam na criação de lembranças, na motivação e servem como uma marcação temporal mental. Mas também não seriam nada interessante se não pudéssemos sentir a situação dos personagens, nos convencemos de que também estamos vivenciando através dos neurônios espelho. Cerca de 30% do cérebro é dedicado aos estímulos visuais, que se sobrepõe aos demais sentidos. Então tente orientar o aprendizado de maneira visual com exemplos de cada etapa.

Decomponha a habilidade em passos menores

    Geralmente cada habilidade é composta por um conjunto de partes que se combinam. Dividir para conquistar. Quando não estamos familiarizados, pode ser difícil de identificá-las. Matemática por exemplo podemos separar em equações de segundo grau, análise combinatória, probabilidade, etc. Digamos que você quer se preparar para engenharia por exemplo, você sabe que o peso em matemática e física é maior, logo você deve focar seus estudos nos principais assuntos dessas matérias. Até o ENEM de 2016, 18% da prova de matemática eram questões de 'Relações de Grandezas' e apenas 1% era 'Progressão Aritmética'. É um ótimo exemplo de como você pode combinar o foco em relação ao seu objetivo e se dedicar de forma consciente.

    É impossível não falar de Tim Ferris nesse tópico, enquanto Josh Kaufman focou suas pesquisas em relação a duração e demonstrou sua teoria de 20 horas, Tim contribuiu criando um sistema em 4 passos para aprender qualquer coisa baseado na desconstrução da habilidade (TED, 2008):

  1. Desconstrução: Ao reaprender uma habilidade, quais são os componentes mínimos aprendíveis?
  2. Seleção: Quais 20% desses componentes devem ser focados para fornecer 80% dos resultados desejados?
  3. Sequenciamento: Em que ordem essas unidades devem ser aprendidas para maximizar os resultados e evitar falhas?
  4. Suporte: Que suportes podem ser usados para superar as dificuldades do passado e garantir a conclusão do aprendizado?

    Um erro muito comum é o excesso de aprendizado focando demais nas teorias, a progressão do aprendizado segue um ritmo semelhante ao da boa escrita: é necessário apresentar os termos e conceitos básicos e aos poucos progredir com novas idéias e métodos formando estruturas mais complexas. Mas é importante apresentar os conceitos básicos já no ambiente de prática evitando abstrações desnecessárias. Esteja atento que simplesmente lembrar e compreender algo, base da pirâmide da taxonomia de Bloom, alimentam o efeito Dunning-Kruger — viés cognitivo pelo qual pessoas com baixa habilidade em uma tarefa superestimam sua habilidade. Para não cair nessa ilusão, ao invés de ficar apenas na teoria procure consolidar as memórias de forma ativa, isto é, praticando e pelo menos aplicando o que de fato você quer desenvolver.

    O próprio funcionamento do cérebro já remete a essa técnica de fragmentar uma atividade em partes, além de ativar áreas específicas apenas para execução: Habilidades motoras complexas têm todos os seus pequenos movimentos coordenados quanto ao tempo e a ordem na hora que são chamados para serem executados (Journal of Neuroscience, 2023). Treinar e ganhar experiência prática na execução é aumentar o repertório e a flexibilidade em adaptá-lo.

Absorver

    Depois de organizar bem suas fontes é que começam as 20 horas de prática. É muito importante iniciar a prática o quanto antes. Nada na vida sai exatamente conforme o planejado e na prática irão surgir novas abordagens e situações não previstas que você terá que contornar.

Eu não falhei, apenas encontrei 10 mil maneiras que não funcionavam

Thomas Edison sobre a invenção da lâmpada

    Minerar na busca pelas fontes e minerar também na prática: os erros tem mais valor do que costumamos acreditar. Os erros têm tanto valor no processo de aprendizado que são a mais antiga forma que a natureza encontrou para aprender e evoluir, são os erros durante a replicação do DNA que geram cada vez mais complexidade nas espécies. Durante o aprendizado, pequenas variações são mais produtivas do que repetir um mesmo método a exaustão (Hopkins Medicine, 2016). Porém não perca o foco, explorar diferentes opções de executar uma mesma tarefa consolida a melhor maneira e leva a um aprendizado cerca de duas vezes mais rápido. Pequenos detalhes como a diferença sensorial projetada como base para executar uma tarefa apresentam grandes diferenças, por exemplo: para soletrar, visuzalizar mentalmente a palavra é mais fácil do que imaginar sua sonorização. Usar a mão não dominante em atividades corriqueiras do dia a dia, como escovar os dentes, também é um ótimo exercício para manter a plasticidade do cérebro.

Insanidade é continuar sempre fazendo a mesma coisa e esperar resultados diferentes

Albert Einstein

    A verdade ilusória é o efeito onde informações repetidas parecem mais verdadeiras do que novas informações. Geralmente são usadas em publicidade, política e aparecem até na propagação de fake news — notícias falsas. Um estudo sobre a frequência de repetições no aumento da crença da verdade ilusória determinou que a segunda repetição é a que mais agrega valor, e as repetições sucessivas acrescentam cada vez menos (SpringerOpen, 2021). Então podemos usar esse princípio para definir um número mínimo de repetições de cada exercício: duas. Mas claro, mantenha uma auto-avaliação e repita até ficar satisfeito. Enuncie cada passo de uma execução em texto e em voz alta para facilitar a compreensão, às vezes pequenas técnicas também são compostas por diversas etapas e cada uma leva um nome. Como em exercícios de matemática, onde você precisa fatorar ou resolver pequenos cálculos em ordem. Com o tempo tudo é executado espontaneamente, mas no início trabalhar enunciado cada etapa ajuda a dominá-las.

    Não cometa o erro de proteger demais suas idéias. Uma crítica sábia ajuda muito no nosso desenvolvimento. Todas as formas de vida buscam manter a própria existência, e de certa forma se entender mantendo as informações que acumularam. Seja em seu DNA seja em suas escolhas filosóficas, a nível consciente ou subconsciente, conciliam as novidades com as bagagens que já carregam. Somos uma parte do Universo se esforçando na autocompreensão. É sábio respeitar as tentativas alheias e tirar algo produtivo sem precisar gastar o próprio tempo confirmando 10 mil maneiras que não funcionam, ilustrando mais uma vez o valor da linguística e das fontes. Por incrível que pareça as pessoas mais importantes em nossas vidas as vezes são as que mais nos decepcionaram, se transformam no exemplo de como não gostaríamos de ser. Não critique tanto, não vicie seus neurônios em se justificar e procurar culpados. Corte esse mau hábito e seja produtivo, agradeça a contribuição alheia e foque no que você acha correto.

Se vi mais longe, foi por estar de pé apoiado sobre ombros de Gigantes

Isaac Newton

    Michael Phelps é considerado o maior atleta olímpico da história por bater trinta e sete recordes mundiais na natação e por ter conquistado o maior número de medalhas de ouro olímpicas (oito) em uma única edição. Seu treinador, Bob Bowman, notou seu talento já na infância, mas seu temperamento ansioso e emotivo eram um problema. Então Bowman o aconselhou a desenvolver um hábito poderoso: repassar em sua mente todos os movimentos praticados, imaginando tudo aquilo que seria preciso para realizar uma prova de natação perfeita, como um filme que pudesse ser analisado em câmera lenta. No final dos treinos seu treinador sempre dizia: "assista à fita de vídeo”. Phelps muitas vezes fazia isso com muitas outras rotinas na sua vida, desde o café da manhã até o momento da prova. Ele também projetava situações hipotéticas, como oque deveria ser feito caso entrasse água em seus óculos de mergulho durante a prova. E de fato, durante uma das provas na olimpíada de Pequim, na China, seus óculos tiveram problemas e mesmo estando completamente cego debaixo d’água ele conseguiu conquistar a medalha de ouro (ESPN, 2008).

    Este exercício de Revisão e Projeção mental pode ser incrementado como um autoquestionamento e autoavaliação dos seus aprendizados analisando a sua evolução. De noite antes de dormir faça uma leitura prévia do material que será estudado no dia seguinte, enquanto adormece revise mentalmente cada passo do aprendizado do dia, como repassar mentalmente os movimentos praticados em busca de uma execução perfeita, e alternando os estímulos sensoriais entre suas projeções (como no exemplo sobre soletrar) simule conversas criativas respondendo e tirando dúvidas de alguém além de pensar em como agir em diversas situações hipotéticas bem como evitar prováveis perigos nas atividades que está desenvolvendo. Estabelecer a meta e ter esse conjunto de intenções motiva as ações e facilita a realização dos objetivos. Na psicologia esse “Planejamento Se-então” é conhecido como intenções de implementação.

Viciados em Emoções

    O emocional está tão ligado ao aprendizado que é inexplicável como insistimos em metodologias tão ultrapassadas. Forçando a leitura de textos e mais textos em um mesmo ambiente dia após dia em uma monotonia óbvia e desgastante, planejada mais para prolongar o aprendizado e consumir mensalidades do que de fato aprender. Na psicologia positiva, Flow é um estado mental onde estamos prazerosamente envolvidos e focados na atividade em questão.

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Divertida Mente da Disney ganhou o Oscar de animação, ilustrando muitos processos de como o cérebro trabalha

    Hábitos angulares, como exercícios físicos, e atingir pequenas metas agregam valores emocionais. Por isso é bom organizar um grande objetivo em etapas menores. Alimentar o sistema emocional durante o aprendizado é uma das maiores buscas da pedagogia. Sentimentos são os verdadeiros combustíveis da vida. Orientam o comportamento, e mesmo sentimentos negativos têm um papel importante. Além do contraste para melhor perceber o valor de sentimentos positivos, durante a raiva por exemplo temos um foco maior na causa dos problemas e procuramos soluções imediatas. A obsessão quando bem direcionada tem grande potencial e trás ótimos resultados. O autodidatismo está relacionado a indivíduos obstinados, com muita curiosidade e vontade de aprender. Pessoas determinadas são focadas, dedicam-se no que dá significado e propósito em sua vida. Reprimir seu potencial é a maior das fraquezas, concentre-se com paixão no que você realmente quer.

    Uma mentalidade curiosa melhora a memória, enquanto uma de alta pressão é mais indicada para resolver um problema urgente ou de curto prazo (PNAS, 2023). Formamos memórias de maneira multissetorial, associamos cores, cheiros e sensações as lembranças. Durante uma experiência nova existe muita informação para ser assimilada e ficamos mais abertos ao aprendizado aumentando a neuroplasticidade para criar novas memórias. Devemos portanto, além de variar o ambiente variar também os estímulos em geral. Porém não confunda associar estímulos com distrações. Por exemplo, enquanto estudava eu costumava mascar chicletes variando os sabores de acordo com o tema, e ao fazer as provas usava o sabor certo para ajudar na busca pelas memórias — hoje uso balas, além de estimular o cérebro com a captação de mais açúcar não o confunde com a mastigação iniciando o processo de digestão, onde cerca de 20% do fluxo sanguíneo é direcionado ao sistema digestivo. Mais importante que variar o ambiente e usar sabores: os estímulos sonoros ativam as mesmas áreas do cérebro que buscam padrões e auxiliam no aprendizado somando valores de familiaridade. O isolamento usando fones de ouvido também ajuda a melhorar sua concentração, já abordei sobre esses estudos nas publicações sobre como criar bons hábitos e como meditar. Então escolha um bom repertório musical e se prepare para absorver.

    O aprendizado passivo é quando você tem o primeiro contato com a informação, geralmente na leitura ou observando exemplos. O aprendizado ativo é quando você contesta, discute e aplica os conhecimentos que adquiriu. Outra teoria distingue o cérebro em dois hemisfério: o esquerdo caracterizado pelo raciocínio lógico e o direito mais ligado a arte e a criatividade. E uma melhor sintonia entre os dois hemisférios aumenta a velocidade de raciocínio além de auxiliar na memorização. Esse princípio deve ser incorporado com a orientação de intercalar atividades diferentes durante o aprendizado. Porém não confunda também intercalar atividades diferentes com a tendência de querer ser multi-tarefas em tempo real. Nem os processadores de computador são multi-tarefas de verdade, eles utilizam o conceito de clock e alternam rapidamente entre uma tarefa e outra dando a impressão de executa-los simultaneamente. Atenção a prioridade das diferentes atividades que for intercalar. Existe um real desgaste com crescimento de novas conexões entre os neurônios e até de novas células, que faz do descanso uma necessidade para o organismo. Um outro estudo aponta a linhaça como um importante alimento que ajuda na manutenção da bainha de mielina dos neurônios, oque melhora sensivelmente a comunicação entre eles (Scielo, 2009).

    Leonard Mlodinow em seu livro "O andar do Bêbado" enfatiza que o cérebro humano está tão mal adaptado para perceber a aleatoriedade que em testes de laboratório ratos têm um melhor desempenho que nós. Talvez não pela fisiologia do cérebro mas pelo condicionamento criado pela própria linguística. Evoluímos a principal base de nossas filosofias com axiomas e conceitos absolutos, provavelmente herdados da beleza matemática da Grécia, onde podemos descrevê-los com certa precisão e elegância na geometria. Desenvolvemos assim toda nossa estrutura de pensamento, porém os conceitos de probabilidade e aleatoriedade só foram desenvolvidos mais recentemente. O sistema de recompensas do cérebro também nos leva a acreditar em causa e efeito, esperamos uma certa recompensa de dopamina a cada ação que julgamos correta, é a neurologia dos hábitos que impulsionam as rotinas. O conceito de karma que pode ser interpretado como a expectativa de um estado emocional como resultado de uma ação, a autopunição com uma consciência pesada até o momento que interpretamos um revés aleatório como pagamento dessa dívida é um bom exemplo. Em um mundo de rotinas não estamos adaptados a mudanças drásticas, e preenchemos essas lacunas com oque a expectativa sugere que esteja lá. Preencher essas lacunas força diferentes áreas do cérebro, e a invasão das emoções às vezes orienta as interpretações de acordo com a verdade que gostaríamos que fosse e não com a que provavelmente deve ser. O apelo constante a intuição geralmente é a preguiça optando pela ignorância na expectativa de uma recompensa emocional em detrimento do desgaste de uma análise racional. E isso não é a verdadeira humildade em reconhecer que temos capacidade intelectual limitada. Existe sim um valor nas intuições, quando pressionados pelo tempo ou necessidade imediata, porém até esse valor está relacionado a um apelo emocional criando um argumento circular e uma própria bolha neurológica. Escolhas aleatórias muitas vezes funcionam melhor do que escolhas conscientes quando não conhecemos a profundidade das nossas decisões.

Memória

Ao lembrar de algo você refaz o sinal das sinapses e altera também a bioquímica da lembrança que tinha originalmente e ao fazer isso você de certa forma está alterando fragmentos da lembrança em si. Logo lembranças desbotam com o tempo.

Scientific American Brasil, 2017

    Nossas memórias não são confiáveis. No documentário Hackers da Memória, para curar fobias por exemplo — que são um medo associado a uma lembrança — colocaram uma aranha na mão de alguém com aracnofobia e ministraram doses de propranolol que atuou bloqueando a noradrenalina responsáveis pela associação de medo a essas lembranças. Nossas lembranças são tão questionáveis que além de intervenções químicas, algumas simples técnicas comportamentais como hipnose e experiências como a optogenética também são capazes de apagar e criarem memórias falsas, e até mesmo o fenômeno natural da retrospectiva edílica — fenômeno psicológico ligado a nostalgia que faz com que julguemos o passado de maneira positiva as vezes desproporcional da realidade que foi. O medo é um fenômeno interessante mas também preocupante no cérebro: os neurônios abrem seu DNA para fornecer instruções genéticas ao mecanismo de armazenamento de memória, essas quebras na fita dupla de DNA em regiões importantes do cérebro são reparadas rotineiramente (epigenética), mas se tornam frágeis com o tempo e aceleram o processo de envelhecimento e doenças do cérebro (PLOS ONE, 2021). A epigenética do medo é um fenômeno tão forte que estudos mostram que podem ser transmitidos de pais para filhos, e até para os netos (Nature Neuroscience, 2013). Parar temporariamente a respiração ou mudar da expiração para a inspiração no início ou no meio de uma tarefa afeta a atividade do hipocampo e também diminui a formação de memórias durante os testes de reconhecimento e condicionamento do medo. (Nature, 2023)

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Experiência de optogenética criando memórias falsas em um rato de laboratório

    Seu cérebro vai classificar por si só o valor das memórias adquiridas de acordo com as emoções ligadas a ela. Muitos já experimentamos voltar a fazer certas atividades depois de um tempo e melhorar o desempenho radicalmente. É o tempo de assimilação natural do aprendizado: a reconsolidação de memória, que segundo alguns estudos leva no mínimo 6 horas (ScienceDirect, 2013). Para gravar as memórias os neurônios fazem novas conexões, podendo até haver modificações fisiológicas com o crescimento de ramificações. Revisar o conteúdo depois de um tempo ajuda a fortalecer essas conexões. Você precisa orientar seu aprendizado praticando exatamente oque deseja desenvolver, sem excesso de teorias. Absorva.

    O hipocampo é o centro que coordena as memórias e as puxa para a consciência, mesmo pessoas que tem problemas nessa área e não conseguem formar novas memórias mantém as habilidades motoras que aprendem. O modo de como o cérebro trabalha ainda envolve muitos mistérios, mas as áreas que ativam as memórias de longo prazo se mostram incompatíveis durante o processo de aprendizado (Revista Ensino e Educação, 2018). Logo, forçar a mentalmente a memorização é um método contraditório ao próprio funcionamento do cérebro. Portanto faça o máximo de anotações que puder. Diversos estudos sugerem que escrever à mão melhora a precisão ortográfica, a recuperação da memória, a compreensão conceitual e facilita a aprendizagem (ScienceNews, 2024).

    Anotações são uma parte fundamental do aprendizado. Anotar força a atenção ao presente além de deixar material para consulta quando for revisar para fortalecer o processo de consolidação de memórias. Além dos conceitos de metadados já apresentados na publicação de como criar bons hábitos, para enriquecer suas anotações separei outras dicas sobre como escrever bem e como fazer bons resumos. Também tem uma rápida publicação sobre como fazer mapas mentais, uma técnica visual que usa o princípio de memória radiante, que é um processo semelhante ao próprio funcionamento do cérebro que não segue um fluxo único e ordenado, sendo útil durante o processo de aprendizado por possibilitar anotações mais fluídas e espontâneas.

    Existe uma poderosa técnica chamada Palácio de Memória, que é usada por profissionais em campeonatos de memorização para lembrar da ordem de um baralho inteiro. Ela funciona como uma anotação mental e usa o conceito de PAOPerson Action Object, Pessoa Ação Objeto — pois é mais fácil lembrar de histórias do que de informações aleatórias e desconexas. Basicamente crie uma história associando os elementos a esse conceito PAO, é a linguagem mais natural que nosso cérebro está acostumado — e quanto mais bizarra mais marcante e fácil de lembrar. Muitos ainda incluem lugares e fazem o personagem viajar entre os ambientes. Para usar essa técnica, faça um personagem evoluir do zero usando elementos de uma história. Ex: Para chegar ao Palácio de Cálculo 1 e aprender a magia de integrais antes precisa passar pela Vila dos tópicos de matemática e pegar o amuleto de equações do 2º grau. Ou mesmo passear pelo interior de uma casa, onde cada cômodo é um tópico.

    Muitos acreditam que o sono serve para recarregar mais facilmente o diferencial eletroquímico no interior dos neurônios, já que a comunicação é feita por impulsos elétricos e nosso cérebro realmente descarrega como uma bateria. E é no sono que acontece a fixação da memória de longo prazo. Vários estudos indicam que ter menos de 5 horas de sono podem levar a criação de memórias falsas (Psychological Science, 2014). Parte dos sonhos também são abstrações do subconsciente das memórias que formamos durante o dia, ligando-os aos mais diversos sentimentos para consolida-los às memórias de longo prazo. É interessante como os mitos e os sonhos têm uma estrutura semelhante com a técnica de memorização Palácio da Memória.

Revisar

    Quanto mais facilmente lembramos de algo, mais aquilo parece verdade. Simplifique suas anotações e crie um arquivo claro e detalhado. Lembre-se das suas dificuldades ao buscar pelas fontes e durante o aprendizado, pense na melhor ordem para aprender cada etapa e o quanto você pode deixar isso o mais simples possível para ensinar alguém do zero absoluto. Procure os melhores exemplos, use imagens, vídeos, crie uma melodia, uma rima, uma piada ou até mesmo uma história aproveitando conceitos da técnica do Palácio de Memória. Puta Velha não recusa Trabalho — Pressão, Volume, número de mol, constante universal dos gases e Temperatura. PV=nrT é a equação dos gases ideais da termodinâmica na física. Com certeza não foi a universidade que orientou meu professor a ensinar desse jeito, mas foi a fórmula que toda a turma lembrou naquela prova. Depois crie uma síntese mais resumida em um passo a passo como um tutorial para consultas mais rápidas. Lembre-se que nossas lembranças desbotam com o tempo, então dedique-se na criação desses arquivos.

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Richard Feynman foi um físico norte americano, que desenvolveu um método simples: Estudar, Explicar, Revisar e Simplificar

    Revisar explicando o conteúdo para si mesmo com resumos ou mapas mentais já é uma estratégia muito utilizada, mas quem já experimentou explicar para outras pessoas percebe como isso melhora na fixação do conteúdo. É uma ajuda mútua sem custo algum. Além de nobre, ao compartilhar nos dedicamos mais devido a responsabilidade além de expor a uma análise alheia. Existe um valor subjetivo de cada um ter seu ritmo, essa dessincronização mantém o interesse constante em determinado assunto por diferentes pessoas, e cada uma tem a oportunidade de ajustar e atualizar o conteúdo de alguma forma. Orientar fecha o seu ciclo de aprendizado e te torna a fonte do início do aprendizado de alguém, seja de forma presencial ou compartilhando suas anotações. Muitas pesquisas sugerem que pessoas com o conteúdo recém adquirido conseguem formar pontes melhores no ensino do que profissionais a muito tempo ligados na área, pois estão atualizadas quanto as dificuldades do aprendizado. A maldição do conhecimento é a dificuldade de imaginar como é para alguém não saber algo que você sabe. Ensinar também é uma auto-avaliação, que também serve de antídoto para o efeito de Dunning-Kruger.

    Algumas sugestões para suas anotações são: formatos diretos como tutoriais, mapas mentais com estilo de fluxogramas, caso o aprendizado de algo consiste de várias pequenas etapas uma coleção de infográficos, instruções ou vídeos curtos explicando cada uma de modo que possam ser acessados de modo individual mas também que se combinem em uma playlist para explicar o conteúdo completo é interessante. Em todos os seus aprendizados mantenha tópicos genéricos mas que são extremamente úteis, como lista de vocabulários específicos e atalhos caso sejam tutoriais de aplicativos.

Para fazer alguém desejar algo torne difícil de ser alcançado

— Dan Ariely, Previsivelmente Irracional

    Mas cuidado, muita expectativa gera frustração. Ao ensinar não valorize demais e entregue exatamente oque prometeu. Evite o dogmatismo e o excesso de opiniões pessoais, bem como da vaidade de querer se mostrar uma autoridade com uma resposta conclusiva. Novas informações estão sempre surgindo, novas técnicas e tecnologias. É mais sensato se manter aberto a atualizações do que querer se passar como uma autoridade em qualquer assunto. Recicle e repasse seu conhecimento buscando ser as muletas do próximo até ele começar a andar por si só — scaffolding é um termo na educação em relação a progressão do ensino visando que o aluno se torne cada vez mais independente. Quando a graça for aprender seja apenas um auxílio na vida das pessoas, não roube o protagonismo da experiência de ninguém. Todos já tivemos uma experiência ruim com um professor que desmotiva ao invés de incentivar. A pior coisa é ficar cego com o próprio ego, tenha humildade ao orientar.

Técnica: Revisão Espaçada

    As férias escolares retrocedem meses de aprendizado, é um dos maiores problemas na metodologia de ensino atual (Hattie, 2008) e nenhuma boa solução foi adotada por qualquer instituição de ensino no mundo inteiro. A revisão é importante na reconsolidação de memórias. Várias vezes na vida trilhamos um árduo caminho de aprendizado para esquecer tudo com a mesma velocidade pouco tempo depois. Após 3 meses geralmente ficamos com algo em torno de 10% do aprendizado original se não mantermos uma revisão ou prática periódica. Existem muitas formas de revisão, a revisão ativa consiste em responder perguntas sobre um assunto recém adquirido, escrever força a atenção ao presente momento e anotar palavras-chaves em post-it espalhados pelo ambiente relembram os termos principais para trazer lembranças associadas ao longo do dia.

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Essa é a curva de esquecimento, do mesmo autor da curva de aprendizado ela quantifica a retenção da memória em relação ao tempo

    Lembra da orientação de fragmentar a habilidade em pequenos passos? Depois de simplificar suas anotações eles servirão para consulta usando a técnica de revisão espaçada para reter seu conhecimento por mais tempo. Essa técnica consiste em 3 revisões principais ao longo do mês:

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    A primeira revisão será feita após 1 dia, você irá conferir se domina todos os passos corretamente (A,B,C,D...). Os passos que você domina você irá colocar na caixa 2 — ou simplesmente anotar —, essa caixa você irá revisar novamente após 1 semana. Já os passos que você ainda não está satisfeito você irá colocar novamente na caixa 1 e irá revisá-los no dia seguinte, e irá repetir o processo até se sentir satisfeito e todos estarem na caixa 2.

    A segunda revisão será feita após 1 semana, confira se todos os passos ainda estão firmes na memória. Coloque de acordo nas respectivas caixas, se já estiver confiante o suficiente pode colocá-los na caixa 3, essa é a última caixa e será a revisão feita após 1 mês.

    Na terceira e última revisão feita depois de 1 mês, você irá se certificar que todos os passos ainda estão confiáveis na memória. Caso esteja satisfeito coloque-os novamente na caixa 3, agora você pode manter uma revisão ainda mais espaçada quando quiser refrescar a memória.

Considerações finais

    O formato digital atinge um enorme público. A teoria dos 6 graus de separação sugere que qualquer pessoa está no máximo a 6 outras pessoas conhecidas de distância de qualquer uma no planeta. Ou seja, o amigo, de um amigo, de um amigo, de um amigo, de um amigo, de um amigo seu conhece uma estrela de Hollywood, o Presidente do Congo ou um aldeão aleatório do Vietnã. E hoje com as redes sociais chegamos a uma média de apenas 4 graus de separação. Existe uma similaridade nesses números com o padrão de sincronias de cardumes e revoadas de pássaros. Esses animais fazem um incrível balé nos céus e nas águas. Segundo um modelo gerado por computador, a sincronia pode ser explicada fazendo com que cada indivíduo adapte seu comportamento baseado somente nos 6 ou 7 vizinhos mais próximos, desde que cada integrante do bando se mantenha atento a apenas 3 regras: se movimentar na mesma velocidade, ficar próximo aos seus vizinhos e ao ver um predador sair da frente. Os Campos Mórficos, sugeridos por Rupert Sheldrake, foram uma teoria hipotética para tentar explicar esse fenômeno: seria a memória coletiva a qual recorre cada membro da espécie e para a qual cada um contribui. É natural quando não dispomos de informações ou evidências suficientes explorarmos as hipóteses de maneira abstrata, ignorando algumas lacunas. Embora essa teoria esteja em um campo metafísico com uma ou outra extrapolação em uma direção não muito científica, de certa forma ela remete a linguística e nosso aprendizado coletivo. Existe um valor nessa era com a oportunidade de cada um contribuir. Os sites Wiki por exemplo utilizam de certa maneira a Sabedoria das Multidões, onde a média das opiniões coletivas se mantém mais próximas da verdade do que cada opinião individual. Uma nova metodologia de ensino, jornalismo e até mesmo política deve se aproveitar desses princípios. Disponibilizar seu conteúdo no meio digital é uma contribuição com potencial inestimável, e pode mudar drasticamente a vida de alguém. Dedico essa compilação a você que leu e tirou algum proveito dessa minha tentativa de contribuir com o aprendizado coletivo, e agradeço a toda contribuição anônima e omissa que não pude dar os devidos créditos.

Não compartilhar uma oportunidade de aprender é um pecado capital

Charles Duhigg, O poder do hábito

    Na infância temos maior velocidade no aprendizado porque observamos e absorvemos sem julgamentos ou preconceito. Na adolescência buscamos criar nossa própria identidade com criatividade e nos revoltamos contra padrões pré-estabelecidos restringindo nosso foco. Quando adultos nos apegamos às nossas conquistas e temos tanto valor emocional as nossas lembranças que orientamos os novos conhecimentos de acordo com elas, perdendo muito da neuroplasticidade que as crianças têm. Flexibilidade e adaptação é a essência que evolui e renova a vida. Muitas vezes presos ao ego da identidade que criamos temos a sensação de estar parados no tempo. A velocidade no aprendizado é inversamente proporcional ao orgulho e autoridade que a pessoa tem, ou mesmo pensa que tem. A população mundial está envelhecendo, e hoje os cientistas já refutaram a ideia de que cérebros adultos não têm capacidade de criar novas conexões e novos neurônios para consolidar novos conhecimentos. Novos neurônios em pessoas mais velhas só demoram mais tempo para amadurecer e têm características únicas (Journal of Neuroscience, 2021). E atividades físicas parecem ser um forte gatilho para esse crescimento neural (Science, 2020). Os neurocientistas também descobriram que músicos profissionais aumentaram o volume cerebral devido ao aprendizado, especialmente das áreas motoras relacionadas ao manuseio de seus instrumentos (PubMed.gov, 2003). A suplementação com a proteína Klotho aumenta a cognição e longevidade (Nature Aging, 2023), e uma dieta enriquecida com vitamina D a aumentada (Molecular Endocrinology, 2003). Como já mencionada a Lei de Weber ao longo da vida nos dá a sensação de que o tempo caminha rápido demais e já não temos tempo algum para mudanças. O árduo processo de aprendizado precisa ser desmistificado e relembrar as pessoas a verdadeira graça de aprender.

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Masalo Wakamiya aprendeu a programar em menos de 1 ano aos 82 anos e virou uma referência mundial

    Lembre-se que você pode encontrar a síntese com os conceitos simplificados dessa publicação no início: na seção Oque é FOAR. A chave para o aprendizado é se manter aberto a novas experiências, praticar e sair da zona de conforto. O Foco deste guia é relembrar como é fácil Observar e Absorver para te orientaR. Tente, deixe de ser só uma promessa para você mesmo, levam apenas 3 dias.

Fontes adicionais:

Aprendizagem Visível para Professores de John Hattie, 2017
Natgeo Teste seu Cérebro
Netflix — The Code:Prevendo o futuro T1:E3
Netflix — Explicando !
Bertrand Russel — Mensagem para o futuro
Educação Proibida
Olhos Azuis documentário sobre o preconceito
TEDx Atila Iamarino como aprender melhor
TEDx Josh Kaufman
TEDx David Christian
TEDx David Eagleman
TEDx de Eduardo Marinho
Seja uma pessoa melhor Nervoso ou Excitado
Nerdologia Como aprender melhor e mais fácil
Nerdologia Défict de Atenção
Nerdologia Breve história dos smartphones
Nerdologia Estamos ficando mais burros?
Nerdologia Por que gostamos de música?
Nerdologia Memória
Nerdologia O sono e os sonhos
Nerdologia O Palácio de memória e memória fotográfica
Nerdologia De onde vêm os Gênios?
Nerdologia Nootrópicos e doping mental
Nerdologia O que é ciência de dados?
Nerdologia Como seria o Tarzan?
Nerdologia Podemos romper nosso limite como One Punchman?
Nerdologia Simpatia Funciona?
Nerdologia 6 graus de separação
Nerdologia De quem os heróis nos protegem?
Nerdologia Por que Perdemos o medo do Perigo?
Nerdologia Discussões de Internet
Nerdologia Oque Rick e Morty faz com suas expectativas
Nerdologia de história Bardos e menestréis
Nerdologia Deus da Máquina

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